quinta-feira, 31 de julho de 2014

Fases incontáveis de uma loucura

Assino impávida em todas as cartas amassadas minha insanidade
com letras que você julga ilegíveis mas são códigos
para adentrar na minha gruta de obsessões e falácias
tão ricas de lirimos e carentes de realismo

Vão dizer que minha paranóia é culpa dos signos
desde um parto prematuro levo no sangue e na matéria
o escorpião a me envenenar a sorte, a tontear os homens
que se apoderam de lascívia ao saber que tenho esse zodíaco quente
mas desconhecem o meu ascendente

Aceito as minhas lástimas com gosto de vinho tinto nos lábios
só para fazer jus a toda astrologia que corre pelas veias
e artérias que me bombeiam forte o coração malicioso
que toca um ritmo vicioso

Sou esse verso sem romantismo que você lê estampado nos postes
e por meus viadutos passaram ilusões tão rudes
que me vesti de mulher madura
só para enfrentar violentamente a rua
enquanto grito forçando os pulmões doentes que não sou sua

Eu sou da Lua que é sujeita a frases intermináveis
de fases incontáveis
e amores incansáveis

Vê como isso soa tão dolorosamente poético?

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Meu chá é de hortelã

Há manchas de batom, chá e caneta por todos os lados. Há pedaços de papéis e amor voando pelos ares com esse vento de inverno desnorteado. Escrever-te me arrepia mais do que sair de casa semi-nua no meio fio da rua, mas não quero me recusar a dar-te um nome. Por acaso você já reparou nas coisas lindas que os homens me dizem?
Nós não daríamos certo porque você não leu as minhas prosas, os meus anúncios, as cartas que deixei abandonadas no quintal da sua casa. Nunca seriamos porque eu preciso de um amor que me cante no domingo e me leia nos dias chatos e escreva poesias comigo no feriado. Preciso de um romance que asfixie o meu sujeito porque estou cansada de estar tão exposta, você não nota?
Não se dá conta que choveu e necessito que você se molhe para esclarecer que minha tempestade não foi em vão? Quero ver sua doença escorrer pelo meu rosto recitando um amor paranóico. A tempestade já cessou.
Você não nota que preciso compor músicas sobre uma obsessão?
Assim tão morno até meu chá é mais interessante...
Assim tão sóbrio você não merece um nome próprio

segunda-feira, 28 de julho de 2014

XIX

Nascida dos retalhos de uma noite mal dormida
do coito errante de um amor desnaturado
fruto de um equívoco
Mas veio certa, íntegra
com sede de viver até gastar a fonte dos riachos
até cansar a sola dos pés de caminhos sem trilha
Perdendo-se e
descobrindo novas regras mentais
debruçando o corpo em chamas na sacada da alma
para inalar a mais pura liberdade conquistada
Da própria solidão ela se possuía
mas no fim da noite não pertencia a nada - nem a si mesma
Deleitando-se de camas e espaços vazios
aproximando-se ligeira do íntimo e vulgar
colocando o coração em um altar particular
pois amor não poderia faltar


sábado, 26 de julho de 2014

Escrevo em devoção ao seu nome

Vejo que carece de meu colo amante
Como quem necessita de ar para satisfazer os pulmões
Ou de morfina para aliviar o martírio
Seus olhos impávidos denunciam o amor que me venera

Nasce a aurora com o grito de morte
Se misturando ao porre noturno que tomei em seu nome
Minha boca entrega o cigarro que traguei por ti
Na busca do seu fim em meu enredo

O cárcere perpetuará seus sinônimos em minha pele
E não precisa ser sábio para desvendar a sua prisão
Não em meus versos crus
Mas em meu peito mórbido

Julga-me culpada de toda a nossa incompreensão
E se maldiz por amar até meus sórdidos defeitos
Beija-me as lágrimas que dóceis estampam a face
Indagando aos ventos o meu padecer

Se eu insinuasse que os olhos não falam você me amaria em silêncio?
Já não posso contar as primaveras com as folhas da margarida
Porque murchar no final da tarde revelaria
Que eu bem-te-quero
Mesmo depois que passar a ressaca de poesia

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Acho que te perdi sem possuí-lo

Você vai fumar aquele cigarro preto com gosto suave de menta e lembrará do meu rosto envolvo por nevoas e sorrisos fáceis. Eu vou lembrar de seus modos educados de me seduzir, da sua barba me alisando um carinho que necessito agora e do sabor da sua boca mentolada. A verdade é que você se envolveu demais nas minhas prosas e se teme uma paixão fora de órbita, não deveria me chamar pra sua casa. Quando fecho as pálpebras consigo pintar aquela vista da praia de Botafogo, me cantando e soprando e recitando prosas a partir de cores serenas. Ah, se embarco no seu corpo você já sabe que vira música e te liberto, te expiro a validade. Quero te cansar com a minha insanidade, esses seus olhos pesados me captam real demais. Sei que duvida da minha saudade, mas se olhar no encosto da sua janela, verá que minhas cinzas ainda estão por ali. Você vai querer me amar quando lembrar dos monstros que achamos nas paredes, das filosofias baratas e de como nos encaixamos bem
Você vai lembrar que eu sou dispersa e que te perdi cedo demais...

terça-feira, 22 de julho de 2014

No domingo meus olhos borraram e o céu também

Os olhos dela borraram o meu domingo

As nuvens cinzentas anunciavam a tristeza do céu, logo choraria. A fumaça do trem me apagava nos finais de semana, observava os passageiros desinteressados, fazia sempre uma prece para que alguém notasse a minha solidão e se identificasse em meio àquele contexto fantasmagórico só para eu não chegar na parada final sem abrir a boca. Comprei um saco de bala por um real porque esse é outro pretexto para adoçar o fim do dia já com gosto de pólvora e cimento. Explodi na fila do banco, da padaria, na passarela do Flamengo, podia sentir o cheiro de bala na roupa. Seus olhos entre tantos eram rubros e cavernosos, devoravam as palavras do pequeno livro envelhecido que estava confinado amavelmente em suas mãos no formato de concha

Os olhos dela enfim tocaram os meus tão cotidianos, mas ela partiu mais rápida do que o trem. Seus olhos borraram o meu domingo, chorei o dia inteiro com o céu. Só fez sol na segunda, vez ou outra nubla na terceira.

sábado, 19 de julho de 2014

Serei completamente sua se fizer de mim seu lar

Embora banhada pelo suor de seu desejo
moldo esse receio de não ser completamente sua
seria tolice duvidar da minha entrega
mas quando você me aperta
eu sinto que me nega o amor
não o amor que está nos livros
o amor que almejo é puramente
a certeza de nossa eternidade

Escrevo sobre os seus adjetivos singulares
desobedecendo as regras de concordância
pois somos irregulares
inexatos e morro de medo disso
desse abismo que nos cavará à incerteza

Decorei as suas formas de franzir a alma
recolhendo-se pra eu não descobrir
os seus segredos
sussurrei enquanto adormecia
que serei somente sua
estava nua
só para te arrepiar minha verdade crua

Deitado assim sob minha cama
você disperso me inflama
me rogo a acreditar na plenitude
da paz encontrada em seu colo
e imploro calada
faça de mim sua morada
da mesma forma que se debruça em meu desespero
e dorme sufocando os nossos medos

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Meu corpo é um esconderijo

58. Descreva uma pessoa que você vê todos os dias 

Toda vez que acordo me debato com ela
me afogando de volta para os sonhos
porque ter que viver
é o que chamamos de pesadelo
e isso não nos desce pela goela

Nossa batalha matinal só acaba
depois que troco a roupa da alma,
aquela gasta pelo dia a dia
Que me pesa no corpo

O coração dela é tão negro quanto a própria íris.
Ela encara o abismo íntimo, os rasgos no passado,
e chora como veio ao mundo: sem querer

Nua ela dança e me convida, me paralisa e equaliza.
Como ela é bonita! Não falo da beleza que seca como uva,
refiro-me à essência que a canoniza

Todo dia ela me encanta com a mortandade
das folhas do outono eterno
refletido pelas suas poesias
que me desenham

Toda noite solitária ela me mostra a Lua
e me canta uma canção de dor
Quando olho no espelho
quase não acredito que a vejo
Curando as próprias feridas 
Ela está em mim 
escondida

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Sou tua pintura mais borrada

Teu cheiro tá em mim, estrangeiro. Consegue navegar no meu relevo se eu te pedir pra afundar em mim? Suas digitais borraram a minha pele de lilás, o meu corpo é o teu quadro, teu pincel. Você me olha de um jeito absurdo de quem me devora em pensamentos e não me importo em doar o prazer que tanto exalo. Meu suor carioca vai salgar a tua boca de saudade, não só de lágrimas vive um homem solitário

deixa que eu te faça cansar com a melodia do meu ritmo,
deixa o verão queimar a sua cama,
você aceita mais um beijo,
um cigarro?

Teu sabor me saciou durante dias, sei que por detrás dessa barba lisa você guarda segredos de outras mulheres mais saudáveis. Estrangeiro, nenhuma vai te escrever como eu te escrevo porque você entrou em mim naquela noite de estrelas tímidas tão fundo que só gozar dessa aventura sozinha seria total desespero. Deixe que eu te trace nessas linhas porque teu destino é mais incerto do que o meu caos particular, volte pro Rio quando a vontade de fazer arte em mim te sufocar

terça-feira, 15 de julho de 2014

Coração ateu

Se observar atentamente os olhos tropicais dela, verá que são feitos de gelo mas que se aquecem da mais firme brasa ao tocarem sua presença. Derrete-se em estações frívolas por ti! Logo essa mulher que é cobiçada por mil homens mais valentes do que você!

Se tocar no íntimo dela sentirá o oceano revolto, as intrigas e os monólogos depressivos. Nos braços não só tatuou cortes, veja além dessa tristeza, sinta cada molécula que te implora pra ser amada. Ame-a com a mesma intensidade que teme morrer ainda na virtude que a juventude oferta, deseje essa mulher que te devora em silêncio! Evoque o seu coração ateu porque é demoníaco observar esse tormento que você se prega.
Seu medo vai te trucidar cedo demais...
Seu coração te levará ao inferno em terra...

domingo, 13 de julho de 2014

Temo que ele leia essa poesia

Temo que ele volte no meio da madrugada
Não porque a rua marginalizaria seu corpo desleixado
Mas porque temo que durma em mim
Durante mais outras noites cruciantes

Temo seus músculos contraindo-me junto à saudade
Esfolando o meu orgulho
Despedaçando o amor que auto-construí

Já não entendo porque te(a)mo idolatrar ainda mais aqueles olhos
Acastanhados e simplórios
Envoltos por uma magia sórdida
Que o deixa com olheiras absolutas

Não me encaixo no meu medo surrupiado
De ouvir os discos antiquados no volume máximo
De reler os livros de Drummond
E cismar que cada personagem carrega o nome dele

Sou composta por batons borrados e temores que me aprisionam
Ora, se me borrei foi porque sua boca não me acerta
Não mais suporto a espera
E confesso por intermédio de rimas incrédulas:

Eu diria sim
Sem temer nosso mais do que esperado fim

sábado, 12 de julho de 2014

Os gringos e as moças cariocas não pagam o teu preço

Há todo um mistério nesse céu mestiço de cores que estampam os seus colares. Copacabana está lotada de gringos loucos pelas tais brasileiras de sorrisos fáceis e molejo doce na ponta dos pés e samba e bocas carnudas. Começou o inverno mas não cai uma gota sequer de água porque os santos sabem da fama que nós temos de tropicais, dá pra ilustrar os raios de sol nos cabelos das moças com seus copos de chopp na mão e o cigarro slim na outra. Sobe o cheiro de hortelã que vem da fumaça importada, da bala, da vontade de beijar um cara que tenha barba.
Em plena temperatura de 43 graus você ta lá debruçado sobre suas artes, trançando sob uma pedra dócil a corda, fazendo um novo colar. Disse com uma voz instigante que âmbar me curaria com um papo quase intelectual  'Ela absorverá a energia negativa, é indicado para pessoas com tendências suicidas ou auto-destrutivas.' Acho que lá no fundo você sabe que nada disso pode me curar, mas bem que sorriu de boca aberta quando eu disse que a tal pedra era inspirada nos seus olhos. 
Não para de chegar gringo falando sacanagem em línguas divertidas e vejo você aumentar o preço porque ninguém te dá valor. Os seus cabelos estão sujos, as suas roupas já rasgaram, a sua fala ninguém mais entende, hippie. Vem se jogar no mar comigo para gente se desfazer um pouco dessa tal energia negativa, me banhe com as suas pedras que choram o preço dessa nossa ilusão por vivermos tão só. 

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Marcha fúnebre XX

Poucos são aqueles que de teus lábios provarão o verdadeiro sabor da saudade. Poucas línguas traduzirão teu nome com o relevo da saliva. Chopin já tocou na minha dor, mas você lambeu, mordeu, sarou. Angustia-me saber que tudo aquilo que escrevo sobre ti irá ao pó comigo, não cabe a mim guardar os escritos que te enaltecem, mas é doloroso mostrar a minha devoção. Se os outros souberem de tuas curas irão pestanejar aos teus pés afinados. Eu sou a tua doença mais incurável, nua, intacta.

Se descobrem os teus encantos
eles vão querer te curar
desse mal que se
chama
amor.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Renascer seu inverno em minha poesia

Eu morri trezentas vezes em seus tons hostis de mármore
Recompus-me fêmea em sua ferida
E como fina casca me fiz de morada
Para pertencer puramente à sua pele usada

Falando de saudades a poesia se corrompe
Vira tatuagem
Se gruda à alma como parasita
Furtando migalhas de reminiscências

É só relembrar que seus olhos de Plutão
Levaram-me à astros
Para reviver que morei em ti outra realidade

Será que seu caos já destroçou a minha raça?
Já não pertenço ao meu sangue
Ao meu destino
Este universo planeja contra nós

Ontem o escasso inverno flagrado de seu peito
Camuflou a geada que me condensa
Derreto em suas camadas
Muito mais do que amadas por minha primavera

Você me disse manso que eu seria o seu fim
E se padeço no instante do agora
É porque ainda morro sozinha
Enquanto vejo-te fortificar no nascer da aurora

Transformei-te em poesia ou a poesia te transforma?
Espero rasgar seu coração
Para te colar nos meus suspiros ínfimos
E metamorfosear o nosso quase-amor em canto lírico

domingo, 6 de julho de 2014

Se te vivo nas palavras é porque te quero eterno

Mato você todos os dias a cada olhar que lanço sobre algum homem de barba mais cheia do que a sua. Mato você todos os dias para te ter insignificante dentro de mim, mato até carregar um cadáver como romance.

Estou sorrindo aos estranhos no meio da rua em plena luz do sol. Veja só com quem estou tendo um encontro, olhe o bar que dancei. Não volto para casa hoje.

Meu discurso está incoerente? Voltei a escrever todos os dias, sei como isso te incomoda porque me faz ser mais interessante. Não estou escrevendo sobre você, as minhas poesias falam sobre sexo e os signos.

Acredito nos signos porque só eles conversam comigo. Acho que ao escrever acabo me conversando. me.com.verso. Gosto dessa pausa.

Gosto dos pontos finais em demasia, isso tem algo haver com você. Conosco.

Gosto de dar espaço entre as frases porque é disso que preciso. Respirar mansa o equilíbrio que você me roubou. Consegue perceber o quanto isso é doentio? Estou te matando em mim enquanto te vivo eterno nas palavras.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Guarda o universo inteiro no olhar

Seus cabelos só não são tão rubros quanto as laterais de sua face porque o verão desse nosso Rio de Janeiro castiga com um sol que te queima de febre. Se eu não soubesse de sua natureza lasciva eu arriscaria um palpite de que sua palidez é falta de amar, mas sei tão profundo que seu peito já está ativo feito um vulcão, mas não por mim que sou pequena brasa.

Marco as horas em que os ponteiros decidem o nosso encontro, o momento no qual me perco e você não me acha porque já perdeu sonhos demais. Sou apenas mais uma ilusão batendo à sua porta e você permanece fechado enquanto me abro nessas prosas enfadonhas.

Conheço o seu cansaço pelos olhos pesados. Como pode um olhar conter o infinito e ser tão vazio ao me olhar te amar assim... Tão de graça...

Não se assuste, meu bem. O meu amor não vai te ferir enquanto houver galáxias que traduzam o quanto a gravidade pesa sobre os meus ombros. Não posso mais ir atrás de você. Não posso mais te oferecer o mundo pois pertence a algo bem maior: à perpétua infinitude de seu globo ocular.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Fiz esse último verso

fiz de mim tão pouca
tão pesada, dolorida
fiz de mim passagem
e acabei passando sem querer
fiz do meu corpo porta de entrada
de quem não tinha intenção de ficar
e acabei indo com cada pessoa que levava
vastos pedaços de mim

fiz de mim poesia e morro no último verso