Enquanto me esfregava entre os dedos, meu corpo rígido fazia folia, rangia, hesitava, até que um jato desordenado lhe sujasse os dedos por dias. "Não fode", escrevia. E me fodia enquanto não esgotasse a última gota que eu tinha. Era êxtase e pressão enquanto dávamos fim ao dia. Desfilava lisa por suas mãos escorregadiças e lábios e me mordia com afinco até que fizesse rachar as laterais do meu esqueleto. Suspira. "Me fode", eu sabia o que ela pretendia. Prensada entre dois dedos afobados, mal notava o desenho corrido; era capaz de pulsar com tamanha pornografia.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017
Foda parte 1.
Das vidraças sujas da poeira urbana constante, eu observava o sol em declínio quase a se perder de vista, se desfazendo por detrás do edifício Mediterrâneo, o mais antigo do bairro. Requentei o café coado de manhã, um coque mal sucedido por causa da falta de cumprimento do cabelo, o cálculo mental da figura íntegra do corpo dela deslizando convulsiva por entre a palma viscosa das mãos, até pousar firme entre os dedos a caneta de acrílico cor azul. Acabara o Malboro, "Não fode", um bilhete à vida no papel que me fitava em cima da mesa. Uma carta ela entenderia. É que me parece tão tarde pra censuras das palavras trancafiadas, de roer o que resta das unhas, poupar tinta da caneta. Escreva. "Me fode", era o que eu pretendia. Escrevia. Com aquele monumento rígido enfiado por entre vácuo dos dedos, me satisfazia.
fevereiro do ano passado
pra cessar ressaca
só tua vista de longe
braços estendidos
uivando entre as nuvens
de fevereiro
mitos carnavalescos
escada rolante
elevados
a lua sobreviveu ao Sol
ladeira íngreme até sua rua
mesmo que os pulmões insistam
a dar sinais de morte
as voltas do pássaro
grande
é preferível morrer
a perecer trancafiado
crise do noticiário
ontem
essa poesia
hoje
pisoteada
a flor e o asfalto
beijar até que a boca seque
e o sol apague a Lua
agora
embriagados
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017
cores de um cenário natural
alagam pedaço de retina
pintura de aquarela
que vinha dos olhos daquela
senhora na praça vendendo todo
tipo de bala
doce minha véia
é que explosivo a gente foge
dos olhos do tempo cedido
ao cansaço dela exposta
enquanto o quadro
o céu seja qual hora
encara a gente
não tem preço agora enquanto
as linhas cedem espaço, crianças
correndo de que? na rua
balas cortam pedaços
as cores
vindo Norte
sob um céu que esmaga
os olhos velhos dela
quando vê
diz
Basta ser
sábado, 4 de fevereiro de 2017
rodear
iria parecer brutal
te convocar
através
de poema
como quem mal sabe
chega hora de erguer
a voz e cabeça
pois é longo dizer
tanta coisa bonita
tantas voltas
mas há algo que diz
do susto
das coisas doídas
enquanto urgência
de alegar nomes
e contornar
volta
é que fugir faz
o vestido vira roda
cabelo e vento
e isso é delicado por demais
pra falar se não for
volta
terça-feira, 31 de janeiro de 2017
sou todas essas coisas, embora não o queira, no fundo confuso da minha sensibilidade fatal
lânguida
escrevo a procurar
- além de palavras
um percurso menos pesaroso
do que me é instituído
não por causa da falta seja
sol ou pedra no feijão
é coisa que não se acha
mesmo no fundo
local ocupado
até pra lamúria
mas é um desconcerto
que assim escrevo
um tanto óbvia
como se a dor
alegoria única
desfilando
à perigosa insolação
e cólera de ócio
fosse atestado de óbito
enrolo o corpo
em suor ou choro e
reconheço partículas
que nos diriam
- vá embora
desisto de caçar
desculpas ínfimas
a fim de decepar
essa ânsia mínima
enquanto escrevo
agora
de me degolar
no fio das memórias
título: fragmento n.30 "livro do desassossego" f. pessoa
domingo, 29 de janeiro de 2017
devíamos dormir mais cedo
quando a noite gritasse em cores nítidas existo! e pelos morros visto que logo em ânsia na tardinha se incendia é ali que saberíamos chegou a hora só vamos beber duas por quinze e os amendoins torrados na mesa não tem fome disso só aquilo que a gente não sabe dizer que vai passando de língua em língua até que o dinheiro como alarme mande embora dos muquifos mas olhe a rua fica acesa os carros atrás de faróis não tão distantes a gente para no meio fio ou invade algum lugar oh céus que não seja meu peito mas as pernas essas vão nos buscar até que a essa hora voar é mais do que o tempo a gente esquece mas se lembra que enquanto recitar algum poema não é tão vão só quis dizer aquilo que nem dois litros tendem a soltar vai que a noite esquece de findar
(e a gente se acaba)
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