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Gyzelle Góes é poeta, pesquisadora e professora. Mestra e licenciada pela PUC-Rio, onde também é doutoranda em Literatura, Cultura e Contemporaneidade. Dedica-se à pesquisa de arquivos literários no Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa e atua nas áreas de Literatura Brasileira e Crítica de Arquivo. 

Desejo, o lastro

Oh, desejo 

como queria ser o anel

do teu terceiro dedo,

margem do teu manuscrito,

folha dependurada no teu ouvido. 

Desejo, se tu em uma palavra 

me arrancasse a palavra, 

em ti o mar descansaria

o meu seio e me deleitaria 

da espuma do teu mastro. 

Fiel, desejo inscrito, se em ti 

eu me apropriasse do lampejo, 

não mais desejaria em nós

a não ser o próprio anseio! 

Furians

Nós, nus, desertos 

Os inversos se escaldariam diante 

de nós, nus. Desertos

Deste ângulo obtuso, contudo,

Penso que eu me encaixaria 

em teus quadris 

Viris, teus gestos. 

O modo como você sorri. 

Para mim, um novo verso.

pousado no meu coração: 

o voo brutal de um peixe silencioso 

o poema que não escrevi me acusa 

devorei-o. 

uma nova vida

viver a vida duas ou três vezes:

aquela de fato vivida, 

e aquela vívida, que está inscrita 

nos meus cadernos 

assim, entro no arquivo de olhos fechados 

olho de dentro, espio o conflito

entre o que narro da memória 

e a lembrança que não pode ser narrada 

pelo simples fato de não mais existir

esqueço e recordo

como em um jogo de testemunhos:

o que nasce é uma nova vida 

pousado no meu coração: 

o canto violento de uma ave silenciosa.