sábado, 29 de agosto de 2020

EU

minhas mentiras usam o ato da verdade para existir

escrevo, atuo, construo o meu papel 
torço as palavras contra o meu favor

e me revelo sem a nitidez 
das lentes, 
dos espelhos ao redor cravados 
nos rostos,

me reconheço desigual,
o mundo assim me reconhece,
como se já existisse uma igual a mim  
que não me pertencesse

mas que fosse mais apurada
do que o gesto do próprio existir 
(o meu) 

uso muitas vezes o eu,
ao me repetir busco encontrar 
a minha diferença, 
o meu momento preciso de indecifrabilidade 

são nesses encontros de fragilidade pura 
em que o reflexo se confunde,
quem eu sou 

o que arrasta a minha escrita

não mais minha
já não precisa  

sou todas essas cópias de uma só palavra 

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