segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Travesso

por todas as estantes 
devo ter estado dedilhando 
o recôncavo do teu rosto reclinado 
na marquise ao fumar unzinho

eu que nunca mais vou dormir 
a dormência de uma criança que nasce 
morta dentro de poemas melindrosos 

você nascendo na década de 80 
e eu descobrindo os leões aos 12 você 
tentando dizer eu poesia você surgindo

ele trabalha aqui dentro dos livros 
dentro desse livro que você decide 
comprar você descontraído ao lado 
dos outros você correndo para repor 
o estoque você de costas aguardando 
alguma dúvida

mas você sabe que eu seria incapaz 
de chamar seu nome se não for 
para falar de amantes ou para discutir 
sobre o peso das horas oleosas 
do teu rosto reclinado enquanto fuma unzinho

Um comentário:

  1. seu poema me lembrou "diário de um abril invisível" por odysseas elytis, recheado termos coloquiais deliciosamente colocados entre termos transversais, travessos. Gostei muito do verso "reclinado na marquise ao fumar unzinho". Gostei da quebra porque geralmente poemas ao reclinarem sobre marquises dão logo vazão para a contemplação de Andes, Alpes ou Everests, fumar unzinho é maravilhoso... viva o português do brasil e, particularmente, o jeito do carioca que ainda resiste

    um abraço

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