quinta-feira, 1 de maio de 2025

Furians

Nós, nus, desertos 
Os inversos se escaldariam diante 
de nós, nus. Desertos

Deste ângulo obtuso, contudo,
Penso que eu me encaixaria 
em teus quadris 

Viris, teus gestos. 
O modo como você sorri. 
Para mim, um novo verso.

terça-feira, 8 de abril de 2025

uma nova vida

viver a vida duas ou três vezes:

aquela de fato vivida, 
e aquela vívida, que está inscrita 
nos meus cadernos 

assim, entro no arquivo de olhos fechados 
olho de dentro, espio o conflito
entre o que narro da memória 
e a lembrança que não pode ser narrada 
pelo simples fato de não mais existir

esqueço e recordo
como em um jogo de testemunhos:

o que nasce é uma nova vida 

segunda-feira, 7 de abril de 2025

domingo, 23 de março de 2025

devorei-o

neste final de março, 
o poema que não escrevi me acusa 

sem rancor, mas com um fiapo 
de sangue coagulado nos olhos. 

sem palavras que me justifique, 
o fito com o mesmo sangue,

este que, ao invés de nos olhos 
se pende às marginais da boca. 

não preciso dizer, 
devorei-o. 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

ferida

I. 
eu amei a princípio o poema 
este que sonhei endereçar a ti. 
depois a ferida na borda da página, 
o ardor da tua superfície 
ao longe e salobra. 

amei primeiro o poema, 
este que, ainda que sonhe,
nunca chegará ao próprio destino. 
depois a cicatriz na lateral do cenho, 
o pavor da tua distância insalubre. 

II.
amante e amigo, com o suor no rosto 
me inclino, escorre o sal em mim 
pelos vínculos, encontra os lábios. 

deixo que me recorde o teu gosto salino.