pelo vale distante
dos espinhos
o riacho ao longe
desacredita
seguro as pontas
como se ir fosse preciso
essas marcas são
uma chave na mão e o corriqueiro suspense entre a dobradura ventilada dos pulmões carbônicos. tudo é molécula entretanto vi na lagoa um brio ensebado que caso contrário fosse apenas modo de imaginação em ativo por necessidade de matéria, não criaria dúvida. existe quase tão em rasgo então o escasso encontro espaço pra se expressar - assim ágil. noto a falta de horas enquanto os olhos aglomeram o relevo dos números, tais quais adjuntos às vezes que traíram o sono no intuito desse café pela manhã. não é sentido, veja bem, tanto quanto àquelas estradas, palavras seguem rotas. é seguro, desacredite no que exprimo, força pasma gera falsa sensação de estabilidade. Durmo, não durmo, escuto os meus pensamentos e enquanto escrevo? E então? Novamente perguntas. caso queira o destino (creio usar as palavras certas) me submeter à vontade de não bater a porta - Realmente não bato, nunca houve.
cristais sob as águas
é um caminho distante e viela
cheia de lixo muvuca de gente
suruba de fome enquanto indigestão
vapor azulado
penso e o coração em pacto
de frente pra colisão
é um fluxo quase convulso
palavras marchando por mãos
só naufrágio estrela em fuga
seguir meu coração?
na solidão transacionar a rádio
portas encostadas sem trancas
compor melodia no violão
não é discurso sóbrio quanto às noites
de um esquecimento póstumo
embora seja o fator principal
as praças convergem
em nós
d e s c o n h e c e r m o s
ouso tocar só no flagelo sentimento
que inflama incubado
em nós
e preza pelo zelo das mãos
é que tristeza tem nome, face e endereço
contudo se manifesta indiferente
sofrendo aborto simultâneo
em campo infértil onde paira o sol
é que tristeza me faz companhia
mas me sinto só
estocada
essa faísca
figura
eco de uma invasão
o buraco estreito
só há passagem
de ida
e volta
volta pra casa
a geladeira tem água
estoque
de tudo que vive
e só existe
procura no fundo do poço
toque
nem telefone ou campainha
é batida de punho
na madeira maciça
A luz que atravessa as vidraças
É o sol a te revelar o corpo
Narrando a tempestade em marca
De uma pele miragem
Desnudando passagens
Transeunte à margem
No cenário de uma exposição
Suas curvas na moldura de um quadro
A sintonia das cores em rima
Liberdade se transforma em melodia
Monumento
Seu corpo é obra-prima
Artista, musa, performer: Lídia Orphão
Como numa amnésia súbita
Nego a poesia dos cantos metropolitanos
Raízes saltadas de praças
Me submetendo ao ócio
De uma poesia desconhecida
Transito a mergulhar na rotina
Seis horas embargadas
Sentarei a escrever um poema
Os escritores sempre tem algo a dizer
Eu não
Eu não sou
Cavalgo serena num cavalo de máquina
As engrenagens toscas
Esse céu forte visto do terraço
São cores de um imaginário
A poesia desconhece o poeta
bebo teu nome
tua cor desbotada
e os olhos de vidro
me vivem como se amor existisse
além do romance nos livros
assim como se fosse matéria
cada glóbulo pulsando meu gosto
então engulo tuas digitais
os rastros no chão envernizado
a cólera precoce
esse mundo destilado
toda conversa amarrotada
na caixa torácica
mesmo atrás da porta
onde não possamos passar
bebo teu cheiro de árvore viçosa
pulsando descompasso
em agito bucólico
só pra dizer que te vivo
após os comas alcoólicos
docas e becos
ouvido em teu peito
viaduto
teu pulso
eu pulso
e escuto
ruído de uma caverna
muro esmurro
intervenção
não sei se você ainda me lê
se me percorre ágil com os olhos
ou recorda do agito desses lábios secos
como se fosse confissão
cada travessão em desconforto
e as vírgulas
os pontos que nada justificam
só te botando em busca
à procura e toda minúcia
detalhada em arte de rua que você não
vê
mal sei se ainda me lê
mas estou transfigurada num esboço
todo instinto marcado na pele em tinta
torcendo os nós que a mudez traduz
no almejo de não passar despercebida
entre cada ponto que você sequer nota
virei mais uma distração
enquanto sua face não se inclina
coração imóvel sem sinal de vida
as rotas
me segue
anota
os pneus em uivo e o muro rima
a poesia como um guia
desaprendi a desbotar os danos
riscar a pele em lâmina
escrever cartas compridas
por amores inéditos
não sei cumprir tratados
romper enganos
pois a desordem me conduz
como um guia turístico
assim por ruas distintas
dentro de vagões insalubres
a escrever poemas rudes
breves
algo conciso
falta
mas já não sei se consigo
retornei aos vícios e quase muda
prescrevo minha sentença
calor do sol no rosto sem proteção
cada paixão em câmera lenta
mas há um espaço que não se ocupa
dentro do peito no meio da rua
tocando a rima com a leveza dos dedos
e compondo uma oração
pois é preciso crer em alguma coisa
seja em alegoria
ou na arte na beleza
pra convocar a salvação
é necessário muita poesia
sol no rosto sem proteção
e os vícios
vícios
absolvição
desbotando deitada à cama
revivo o sol em seus olhos
bem perdido
como se fosse um ponteiro
de um relógio atrasado
e todos os pesadelos regressam
mesmo que o sono não entre
por intermédio das pálpebras
no meio de nós unidos entrelinhas
o pequeno calor acaricia meu peito nu
mas o verão me esgota tanto
a ponto de gingar os joelhos
em plena praça pública
só de serventia pro pleonasmo vicioso
essa estrela de fogo
digita sob minha pele ociosa
cada confissão enfurnada
dentro
de um corpo maleável
e todos os pesadelos são prelúdios
mesmo que a noite durma
sob nossas carcaças
não havendo antídoto pra vigília
da lua enquadrada acima da cidade
incolor e despida
revelo traumatismos
através da linguagem
tão sucinta que outro não notaria
esse escarçel implícito
tão acolhido
pelo sol entardecido
dentro do seu globo ocular
um planeta inteiro encolhido
e um sorriso refletido
meu busto umidamente descalço
exausto de não repousar
mas o sonho intacto
enrolado em nosso suor
estagna o tempo em fuga
e a madrugada que não tarda
todo verão contido em sóis
parada
no trânsito
na gávea
esse pensamento suado
meu peito é o verão
em pleno carnaval
você me fala de amor
dos blocos
e serpentinas no cabelo
essa rima impura
álcool descendo pelas ruas
caçando um pé descalço
todo caos entrelaçado na multidão
enquanto você me fala de amor
como se todo mundo ouvisse
e fosse ficar calado
por causa dessa inauguração
no trânsito
na gávea
essa conversa afiada
todas as pontes engarrafadas
que me conduzem à sua calmaria
você me falaria
dos confetes arremeçados
das vezes que passei do ponto
e não me assustaria
o pensamento estagnado
o bloco anunciando
essa última
parada
o amor estacionou
o céu empoeirado
e o tempo exigindo nomes
endereços
acordos
não selam lábios
mas acordar é silencioso
ruas estreitas
esquivos olhares equívocos
é só mais um pássaro
no asfalto
esfolado no peito
pedindo perdão
buzinas
e faróis
seios macios
pele ardendo no sol
e um pouco de amor
nas bochechas
um tanto de rancor
no barulho do motor
e um coração mecânico
acionado em horário de pico
transitando
as palavras apontam
como se fosse um semáforo
uma faixa de pedestres
indicando o caminho
sem tráfego
o trânsito
só de nuvens
pó
e histeria
tem dias que a gente morre calado
quando a ladeira pede um pouco de calma
e a cor das fotografias perdem seu valor
é o pulso gemendo em silêncio
versos pingando
a poesia vibra como um alarme
uma arma
um explosivo
o chuvisco cantarola
mesmo quando o dia amanhece neutro
e as plantas murcham
dentro de um pequeno vazo cinza
num simples relato de uma crônica malfeita
mesmo assim haja pulmão
os dedos
e peito
peito
só assim as palavras
os poetas
transam
e eu gozo com os punhos cerrados
ciente da fraqueza dos versos
enquanto o cimento da rua seca
sem que restem sinais de digitais
das folhas que despencam no verão
a poesia vibra como um alarme
uma arma
um explosivo
é nesse instante de distração
que o poema geme com delicadeza
e o último fôlego
acompanha o berro do coração
46
sozinha
assistindo a noite
invadir a casa
o cão sobe no sofá
a goteira do chuveiro parece chuva
vejo a lua tão turva
parece ficção
ou obra de um Deus
que desconheço
troco de canal
a mobília da sala
roupas
e insisto no poema
tão solitário
quanto a lua
eu
e o cão
sozinha
crio diálogos
que viram página de um diário
deixo as obrigações pra amanhã
averíguo a despensa
vazia
morro no sofá
assistindo o dia
e dilemas
invadirem meu poema