Você é o canto bonito que existe em mim
disse ele, sem querer chorar
porque chorar era fraqueza em um mundo
em que os olhos são desertos
Eu não compreendo o que ele quis dizer
se me vê como morada da própria vaidade,
um canto para refugiar-se com cheiro de tinta fresca
sem mobília pois o vazio ocupa muito espaço
entre nós
Se sou música amanhecida e fúnebre
canto de passarinho que chora a cada manhã
por não ter morrido antes do sol flertar o dia
que é pesado,
cinzento
Os olhos dele articulam esse mistério
mas eu não aprendi a ler poesia de mudo,
muda mais rápido que a posição dos ponteiros
do relógio que grita
o tempo que não nos sobra
Bem capaz dele querer nada ter dito
e eu, desvairada, nadando fundo
nesse abismo sem escrúpulos
Não sei em que estação me encontro
porém o vagão de chuva anuncia
que pouco fui e nunca serei
aos olhos de Poeta
Bom dia Gyzelle..
ResponderExcluirquantos de nós que poetamos já vertemos lágrimas por vezes sangrentas de ilusões e amores irreais.. a poesia vai além dos versos.. ela nos transporta a planos maiores.. abraços e um lindo dia até sempre
Bonita dualidade. A tristeza se fez por uma oposição frágil. Muito bacana mesmo.
ResponderExcluirgyzelle, que poema bonito.
ResponderExcluiré lindo ler algo assim, eu aqui na minha vida em plena manhã de domingo. :)
estava lendo seu poema e quis rebater sem pressa de intrepretação; esqueci, fiz as coisas da semana e voltei usando outros autores que ia lembrando; os trechos não tem nenhuma intenção linear de querer semelhanças, foi apenas eu vagando tuas ideias indo parar noutros autores. foi um barato porque as ideias param em tempos e lugares tão distintos que ficamos com a sensação de que poesia é algo por fora.
ResponderExcluirum abraço
Emily Dickson - A Coffin—is a Small Domain
A Coffin—is a small Domain,
Yet able to contain
A Citizen of Paradise
In it diminished Plane.
A Grave—is a restricted Breadth—
Yet ampler than the Sun—
And all the Seas He populates
And Lands He looks upon
To Him who on its small Repose
Bestows a single Friend—
Circumference without Relief—
Or Estimate—or End—
Delmira Augustini - Lo Inefable [excerto]
Yo muero extrañamente... No me mata la Vida,
no me mata la Muerte, no me mata el Amor;
muero de un pensamiento mudo como una herida.
¿No habéis sentido nunca el extraño dolor
de un pensamiento inmenso que se arraiga en la vida
devorando alma y carne, y no alcanza a dar flor?
Murilo Mendes - Reflexão n°.1
Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho
Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio
Nem ama duas vezes a mesma mulher.
Deus de onde tudo deriva
E a circulação e o movimento infinito.
Ainda não estamos habituados com o mundo
Nascer é muito comprido.
Antonia Pozzi - Grito [trans. ramonlvdiaz]
Não ter um Deus
não ter uma tumba
não estar nada firme
somente coisas vivas que escapam -
ser sem passado
ser sem futuro
e cegar-se nesta ausência
-ajuda-
a miséria que não tem fim -
Holostasis, que coisa profunda! Quanto zelo posto a um comentário, quanta poesia em prato cheio! Espero que volte novamente e se quiser conversar, me avise.
ExcluirSamuel, Diego e Antônio eu só tenho a agradecer pelo comentários que são tão inspiradores quanto a própria inspiração...
ResponderExcluirGyzelle, primeiramente, muitíssimo obrigada pelos seus dizeres! Dito isso, digo que, quanto ao seu costume de escrever nas multidões carecedoras, como pôde o ver, também o faço. A gente se reinventa para viver, desmanchar o peito - ou complementá-lo. A gente se salva para ser mais, não? E, quem tem piedade da nossa densidade, é porque não sabe que dizer é preciso, porque sente-se. Estar para ser. Dizer para viver - e sobreviver.
ResponderExcluirEsta sua poesia choveu em meu canteiro. Irei guardá-la, como se estivesse fugindo do silêncio, segurando-a em meu ventre.
Ainda que em silêncio, sigo-a. Continue chovendo.
Vá consigo, e fique bem.
Beijo de luz, cara!