terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Rio de Fevereiro

Eu que tanto adulei o verão tô agora reclamando para as paredes desse quarto-e-sala enquanto vejo você tomar esses banhos rapidinhos e voltar molhado pra cama. Tá bem Moreno, você sai nesse sol carioca para uma caminhada e quando volta faz nescau com gelo para compensar a próxima partida, eu aceito teu sangue da gema. Comprei um guarda chuva preto na última tempestade repentina, te ouvi dizendo que isso daria azar e foi isso que aconteceu com minha felicidade, você sempre teve essa alma de cigano barato e eu odeio quando joga com a minha sorte. O Cristo tá com os braços abertos bem em frente à minha janela de azulejos, você fuma curvado enquanto olha para ele e faz seus diálogos boêmios pensando ser teu amigo do peito. Faz tuas rimas quando tá dobrando os lençóis suados e me desfaz a hora que quer. Se pergunto sobre nosso romance a resposta é um sorriso de lado, uma mordida no ombro e um beijo mudo com cheiro de cerveja, corre a tempo de não me ouvir repetir e só volta quando acha que eu esqueci com chocolate comprado na banca ao lado do senhor Adriano. Cara, esses chocolates chegam derretidos e sujam as minhas mãos igual a você. Eu tô suja, quente, suada e cansada de sua malandragem, mas quando ouço teus passos no corredor ajeito os cabelos e passo aquele batom vermelho que te excita. Quando o sol dá trégua o céu começa a escurecer, você acende meu calor junto com as luzes da avenida, elogia uma parte do meu corpo como se eu fosse a única e se esquiva do meu quarto para algum bar da Lapa ou qualquer saia com pernas. Eu contei tuas formas devassas de me ganhar, somam até agora 251 delas, número de vezes que entrou nesse apartamento. A culpa é minha de ser tão vulgar e permitir que um cara desses tenha a cópia da minha chave, mas você desvendou todos os meus segredos.

Passei na Fonte da Saudade, lembrei da sua carioquice quando vi selos da calçada dançante de Copacabana, comprei outro batom de cor quente e ouvi o Cristo zombar de mim, Moreno, carnaval tá chegando. 

9 comentários:

  1. Ah, toda a mulher se perdeu ou perderá um dia por um maravilhoso cafajeste!...Desde que saibamos que ele é mesmo cafajeste, não haverá grande mal...:-)
    Mas 251 formas devassas de te levar à certa, é bem demonstrativo do talento desse Moreno.
    Gostei muito de ler este texto!
    xx

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  2. Laura, na certa esse Moreno tem muito jogo de cintura. Eu que gostei do seu comentário!

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  3. Boa tarde Gyzelle.. pois é o que mais acontece.. muito bem descrito.. não tenho preconceitos mas a alma de muitos seres sai ferida ver princesinhas como podemos chamar estando nas mãos de cafajestes como disse a Laura.. parece que a atração é sempre mais forte.. estar no bom caminho e sonhar com algo sereno esta parecendo mera ilusão e já faz tempo..
    não deixe de ser diferente do que descreveste.. a bebida, o cigarro, a sedução fria mas que dizem ser sedução.. tudo faz parte do jogo.. o jogo que escolhemos participar neste momento..
    até sempre moça querida

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  4. Ótima cronica! Muito bem construída, gostei Gyselle.

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  5. Obrigada por ambos comentários, espero que sempre voltem por aqui pois o lugar está gelado para esse calor de janeiro.

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  6. "A culpa é minha de ser tão vulgar e permitir que um cara desses tenha a cópia da minha chave, mas você desvendou todos os meus segredos."

    Curti, você faz umas comparações muito bacanas

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  7. nossa, demais o teu conto. lembrou muito Chico Buarque. bjs

    http://umanjotriste.blogspot.com.br/

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  8. "Cariocas não gostam de sinal fechado..."

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  9. Fico grata que tenham gostado, esse Rio me inspira e os cariocas também.

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