quinta-feira, 25 de agosto de 2022

A noite

Transpasso uma longíssima noite
de inverno, com um brinco de vidro
dependurado, você me diz:

Ao atravessar olhe para os lados
e estende os pulsos, sucinta.

Você me dedica um haicai 
na palma da mão, me encolhe
o sorriso. 

O seu rosto me parece uma lâmpada 
que cai e reacende. A noite. 

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

sobrevoar

longe são seus olhos
que se debatem e perambulam 
se avistam a poesia dos meus, tácitos 

paralizam se avizinhados 
insones e distanciados 
são seus olhos 
aqueles os quais primeiro se calam 

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

palmeiras

veja só como discutem os seus pares
unindo os punhos e soando socos
conjugados ao ato

tira-lhes o dom 
de fazer poemas
e só lhes resta o pôr de um sol cansado

você que os versos tem contado  
as palmas e o calor das bananeiras
olha às minhas veias como quem suspeita: 

ao som de uma palmeira à espreita 
percorre da seiva este silêncio sussurrado 

sábado, 13 de agosto de 2022

com você eu sinto o desejo

com você eu sinto o desejo
de nunca terminar um poema
de nunca começar um poema

o seu corpo de estátua ao meu lado:
por você eu deserdaria a palavra
para habitar o silêncio 

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

o que fizemos das nossas delicadezas

Adquira o seu exemplar da 2ª edição comemorativa de "O que fizemos das nossas delicadezas" no site da Editora Folheando 

https://www.editorafolheando.com.br/pd-8b3ac4-o-que-fizemos-das-nossas-delicadezas.html?ct=&p=1&s=1

terça-feira, 9 de agosto de 2022

rio das pedras

há uma profundeza
no teu passo
petrificando os meus 
quando trepido ao teu lado

apenas quando cala
o rosto em meio à fala
o teu suspiro esbarra
nas ruas que atravessamos

por você eu descobriria 
o avesso das pedras 

belo o jeito como soamos sorrisos

quando o sol nos coroa 
pergunto a imagem que a gente fazia
nos troncos descontraídos 
da pele raiando as raízes 

a marca do teu rosto rastreando
as ramagens louras
e os brotos corando
o verdinho queimando as pálpebras

coisas em silêncio me pergunta
ensaia uma nova balada
arquivo as veias da poesia
ao teu esboço arqueada

dizendo coisas da boca em bamba 
mais um enredo ao nosso gole
entramos no samba

eu me pergunto da cena que a gente faria
quando o amor se fizesse brilhar
mais do que o próprio reflexo
de Narciso no rio

éramos bonitos e a paisagem um brinco 
falar da natureza é transformar
o que fazíamos encolhidos
raio de versos um poema desprevenido

domingo, 7 de agosto de 2022

pedra da lapidação

                À Foed Castro Chamma 

o exercício de te amar
esculpir 

em uma pedra 
um colar

do penhasco

como quem põe as impressões 
do amor
em uma rocha

nos atrevamos 
ao exercício das lapidações 

quarta-feira, 3 de agosto de 2022

antes de viver o sonho o sítio

I.

antes de vivir el sueño el sitio

los pájaros 
picotean y sorben 
nuestra casa
soledades 
en la puerta 

pensé que nunca nos ubicaríamos

II. 

antes de morar o sono o sítio

os pássaros
bicam e bebericam 
a nossa casa 
solidões 
na porta 

achei que nunca nos situaríamos 

terça-feira, 2 de agosto de 2022

água com açúcar

a destreza do teu gesto
ao rodopiar os dedos 
pela borda de um cigarro

o teu pigarro flácido 
noto o teu cisco se desorientar 
no busto de um cobertor 

dentro de uma tarde cinza 
você me sinaliza 
vamos à casa 
dar de beber à sede aos beija-flores