sexta-feira, 31 de julho de 2015

você está aí?

massagear seus pés
rudes e exaustos
ouvir os poros em chamas
clamar minhas mãos
astuciosas
te rimando
ritual de dedos ágeis
senhas e passagens

descobri um astro no seu umbigo
(um coração toca a campainha)

nos meus versos
eu te toquei
ultrapassando a carne
os ossos sisudos
te infiltrando e penetrando
invadindo sua casa sem número

parasitando sonhos
intranquilos de um insone
te entrando
sem receber convite
(o número de desempregos subiu)

a fechadura sarou
fiz dos seus braços o meu violão
maciço
macio
eu te toco
toc toc
você está aqui?

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Alilás

apresento ao sol minhas lentes
de reflexo
com sensibilidade
à exposição de afeto
até aceitar que o asfalto
absolve
os corpos multados
os passos corridos sob sinais entrecortados
anunciando
que ficar parado enquanto
avançam os carros é pior do
que morrer atropelado pelo tempo

contemplo distraída as múltiplas violetas murchas 
enroladas no pescoço 
de fulana
[violentas flores]
só então entendo que lilás é poesia
quando o céu decide 
espancar
as cores líricas antes do sol
se despedir de
requentados amores

fumo
mais um cigarro
segurando a ponta do
horizonte entre dedos como se morrer
lentamente
pelo tabaco incendiado
fosse motivo pra render mais uma página no jornal 
sobre os perigos do
fumo diário

trago notícias
mais um nome que morreu na poesia
um corpo baleado
s
o
b
e
o elevador
tiro ao alvo
há um silêncio esmagador no metrô

escondo no bolso a minha sede condensada
como quem se adapta
calculadamente
ao deserto de olhos
apáticos

há versos abafados no armário
o condomínio está atrasado
uma ferida no peito do pé
nasceram flores ao chão
do bairro
[violentas flores]
espancando
a solidão onde mora
dores

terça-feira, 21 de julho de 2015

esquiva

eu estava virando a esquina
eu estava virando uma esquina
mais esquiva do que os seus lábios
eu virei a esquina tão rápido
parecia estar fugindo do vento
cortando a esquina
ou o meu fígado com uma garrafa de vidro
depois que eu bebi todo o dinheiro que tinha 

há tantos 
de passagem em mim 
que virar a esquina não é o perigo
eu virei a esquina sozinha
mesmo virando
a melhor parte de mim
depois da bebida

eu fico esquecida
então viro esquiva sem virar pra trás
evitando voltar ao início da esquina
onde deixei você
o dinheiro do cigarro
da próxima bebida
e da passagem volta
porque só tenho no bolso a de ida

domingo, 19 de julho de 2015

o seu nome escorre quente em minha boca


se não me levasse tão a sério
me levaria pra cama 
de quatro 
rezando pelo nosso pecado
que só existe quando escrevo com 
a língua na pele 
em carne 
ríspida 
o suicídio de um verso mal gozado

ao menos me entregaria algum 
resumo 
seja o seu número 
ou um olhar mais dócil 
do esse perdido no próprio tumulto
não me deixaria esperando por notícias 
sobre o novo tom da sua camisa engelhada 
na gola por culpa 
quem sabe? 
de alguma briga 
quem sabe inteiramente minha

estou sugerindo soluções 
menos dramáticas
e mais sutis do que esse seu exército 
de desdém construído 
como armadura 
é que preciso ser levada a outro lugar 
menos formal 
onde possa ficar 
tão nua e sua 
quanto as letras soltas endeusadas 
em um papel inerte 
e possa sambar junto ao ritmo de 
suas
veias 
agressivas 
saltando do corpo 
até que o coração nos recorde 
que a poesia 
tem nome 
mas 
as vagas estão lotadas 
e os vagões 
enquanto nós vagamos vazios 

se não me levasse
tão a sério 
eu diria que te levo também 

terça-feira, 14 de julho de 2015

Tua

A poesia lambendo o lóbulo da orelha
A poesia entre os beiços
Molhando o teclado
A poesia suja
A poesia fluída
Poesia ticket + dose dupla de vodka
Poesia transviada
Eu juro
Se não pularmos antes de
atravessar o viaduto
Muita poesia no muro
Só poesia português padrão
Só poesia tua minha é nós na garganta pra caralho
Poesia pseudo culta pós-impressionante
Poesia fajuta trocada por uma grana curta
mas
ela é
grande
Estamos distantes
Distantes e
Eu vou falar da poesia intrusa
Em tudo aquilo que protesto
Poesia manifesto
Manifestada de forma bruta
Poesia é coração de puta vadiando no carnaval do Rio de 
Janeiro é mês de ferver o corpo nas ruas em horário de verão
Poesia sol na pele a tostar
Fio dental e removedor de vazios
A poesia encheu o vaso
O vácuo
Entre duas bocas
Poesia escorrendo pelo queixo
Pingando no chão da sala 
2 quartos 
1 cozinha 
varanda de frente pro puteiro 
Mais barato do bairro
Poesia gozando da sorte
Sentença de morte, Vida e outras artes


Poesia é você

sexta-feira, 10 de julho de 2015

perca

Descobri que remetente é a cor do céu no inverno
Quando a lua fica cheia de nós e desaparece
Mas há uma avenida cheia de passageiros
Fugindo daqui dessa gente desenganada
Dessa espécie que inventa o amor mesmo que o verbo amar
Tenha sido usado tantas vezes que até tenha perdido o significado

Bares lotados e há um trocado pra mais uma dose de percas
Eu também me perdi mas quando as nuvens se chocam
O choro é coletivo na hora mais cheia do dia

A lua permanece inteira e estou perdida sim achando que o horário de Brasília
Não regula o medo do tempo
Não é de chuva que temo quando o cinza
Pinta as cores dos seus olhos de verniz

Só enfrento as horas a mais no calendário
E inalo um pouco de mim pra ver se fujo de nós na garganta
Perdi os sonhos no canto da boca e a vontade de dançar
Com o inverso no peito da caneta

Versos sobre o carteiro que fugiu dos correios
Me deixando assim entregando olhares alheios
Estamos interpretando o desespero
Achando perda em cada tampa sumida de cabeça
Não me deixa esquecer de você recitando poesia sobre suas manias...

Eu te perdi mesmo sem nunca ter nem o direito autoral ao seu nome cotidiano
É tudo isso um engano
Enquanto o rádio também inventa de chorar conosco no banho
Mas quem tem paciência pra choro quando o coro de indivíduos
Soa despercebido e a gente ouve os zumbidos do mundo
Querendo respirar um pouquinho

Minha rima está perdida dentro da tampa da caneta
No cheiro da sua camiseta indo embora antes que eu me desse conta
De que perdi a hora e as conta dos passos de volta pra casa sozinha
Eu perdi até a vontade de continuar essa poesia...

terça-feira, 7 de julho de 2015

pedalinho

eu não sei se notou
mas a cidade está mais cheia

e íntima
e doida varrida 
não sei se notou que te olho
quando há uma distração em sua fala
momento em que me nutro de harmonia e instabilidade

não sei se notou 
mas somos as desequilibristas 

o Cristo fica colorido em dias específicos
e a lua tem aparecido antes das cinco
no instante em que você pega a sua bicicleta
e equilibra a própria vida entre o meu coração
e o espacinho instável do asfalto 

que a minha boca quer morar 
em seu corpo feito se te adorasse
mas não sei se notou 
e olha que eu te adoro